quinta-feira, 19 de junho de 2008

Responda sinceramente: qual o jogo da sua relação, tênis ou frescobol?



Depois de muito meditar sobre o assunto, concluí que os relacionamentos são de dois tipos: há os do tipo "tênis" e há os do tipo "frescobol".Os relacionamentos do tipo tênis são uma fonte de raiva e ressentimentos e terminam sempre mal. Os do tipo frescobol são uma fonte de alegria e têm a chance de ter vida longa.O tênis é um jogo feroz. O seu objetivo é derrotar o adversário. E a sua derrota se revela no seu erro: o outro foi incapaz de devolver a bola.Joga-se tênis para fazer o outro errar. O bom jogador é aquele que tem a exata noção do ponto fraco do seu adversário, e é justamente para lá que ele vai dirigir sua cortada - palavra muito sugestiva - que indica o seu objetivo sádico, que é o de cortar, interromper, derrotar. O prazer do tênis se encontra, portanto, justamente no momento em que o jogo não pode mais continuar porque o adversário foi colocado fora de jogo. Termina sempre com a alegria de um e a tristeza de outro.O frescobol se parece muito com o tênis: dois jogadores, duas raquetes e uma bola. Só que, para o jogo ser bom, é preciso que nenhum dos dois perca. Se a bola veio meio torta, a gente sabe que não foi de propósito e faz o maior esforço do mundo para devolvê-la gostosa, no lugar certo, para que o outro possa pegá-la.Não existe adversário porque não há ninguém a ser derrotado.Aqui, ou os dois ganham ou ninguém ganha. E ninguém fica feliz quando o outro erra, pois o que se deseja é que ninguém erre. O erro de um, no frescobol, é um acidente lamentável que não deveria ter acontecido, pois o gostoso mesmo é jogar pra sempre... E o que errou pede desculpas, e o que provocou o erro se sente culpado.Mas não tem importância: começa-se de novo este delicioso jogo em que ninguém marca pontos...A bola são nossas fantasias, irrealidades, sonhos sob a forma depalavras. Conversar é ficar batendo sonho pra lá, sonho pra cá¡...Mas há casais que jogam com os sonhos como se jogassem tênis.Ficam à espera do momento certo para a cortada. Tênis é assim:recebe-se o sonho do outro para destruí­-lo, arrebentá-lo, como bolha de sabão...O que se busca é ter razão e o que se ganha é o distanciamento.Aqui, quem ganha sempre perde. Já no frescobol é diferente: o sonho do outro é um brinquedo que deve ser preservado, pois se sabe que, se é sonho, é coisa delicada, do coração.O bom ouvinte é aquele que, ao falar, abre espaços para que as bolhas de sabão do outro voem livres. Bola vai, bola vem - cresce o amor...Ninguém ganha, para que os dois ganhem.E se deseja então que o outro viva sempre, eternamente, para que o jogo nunca tenha fim...
Fonte: Rubem AlvesLivro: O retorno e terno, p. 51
Transcrito por Duda Mendonça em seu blog.

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